Guerra Civil (Civil War) apresenta-se para nós como uma obra visceral e impactante. Ação do início ao fim, prende a gente na cadeira em completo silêncio e admiração.
Alex Garland (Ex Machina (2015), Annihilation (2018)) assina o roteiro e a direção desta obra de arte. Trazendo traços bem típicos de suas outras criações que são, também, da ordem de uma realidade distópica, Garland nos conduz a uma possível Guerra Civil que se instaura na América do Norte.
GUERRA CIVIL, ROTEIRO
Alex Garland, como mencionei acima, é um roteirista e diretor muito familiarizado com histórias de realidade distópica, levando-nos a mergulhar em enredos que nos espanta, espanto este que só pode ser gerado porque nos faz refletir o quão essa realidade é distante ou cada vez mais próxima.
Assim ocorre em “Ex Machina (2015)” e em “Annihilation (2018)”, dois excelentes títulos muito bem trabalhos e inteligentemente escritos.
Guerra Civil segue uma linha própria, sem perder os traços de Garland, o roteiro é bem construído desejando-nos mostrar como explodiria uma Guerra Civil na América do Norte, mergulhando unicamente na vivência norte-americana desta situação. Em nenhum momento ele sai da América do Norte para poder explorar as consequências disto no mundo.
A sugestão de que todo império pode vir a ruir, é muito inteligente. Mais ainda, é revelar – indiretamente, talvez – que independentemente do quão este “império” liderou a economia e afins do Globo, ele pode ser insignificante para tantos outros grandes países de economia relevante.
Há poucos diálogos no roteiro, percebo que ele foi construído praticamente para se fazer a si mesmo através de imagens, tanto de dentro, feito pelas próprias personagens quanto “de fora”, através das lentes de Garland (na direção) e de Rob Hardy (Men: Faces do Medo – 2022) na direção cinematográfica.
O que, na minha opinião, foi uma jogada excepcional, difere do comum que esperamos, os diálogos são para dar sustentação ao filme, entretanto, não são a parte fulcral do filme. Ele se dá pela construção cinematográfica, relação dos personagens e trilha sonora.
GUERRA CIVIL, DIREÇÃO
Alex Garland segue em uma direção impecável, do início ao fim, nos mínimos detalhes, em todos os silêncios e gritos abafados, explosões e reflexos, realizou uma direção extraordinária que prende os espectadores do início ao fim!
Logo no início do filme em que Lee Smith (Kirsten Dunst) está assistindo ao jornal, passa-se uma cena em que o presidente dos EUA está discursando e, bem após o discurso dele, abre-se o mapa do país, na TV. Ao tempo que o mapa do país é exibido na TV, a câmera foca na janela do quarto, onde podemos ver um local explodindo e pegando fogo.
Neste exato momento, o vidro da janela treme e o que se reflete nele é a imagem da TV, ou seja, o mapa dos EUA pegando fogo e tremendo. Um detalhe tão genial e tão minucioso, que já diz muito sobre o que essa história distópica quer nos trazer.
Assim se segue Guerra Civil, até o fim, estas sacadas inteligentes e genuínas, que nos movimentam, que asseguram a nossa atenção e que esmiuça todos os detalhes atraindo nosso olhar atentamente.
GUERRA CIVIL, ATUAÇÕES
As atuações são impecáveis, não necessitam de muitos diálogos, aliás, é um filme cujos diálogos, apesar de importantes em alguns contextos, não são aquilo que trazem sustentação para o longa.
A base que leva o filme a se tornar uma obra impactante e visceral, é, sem dúvida alguma, o quão os atores conseguiram carregar a emoção em todos os seus gestos, olhar, silêncio e entrega.
DESTAQUE VAI PARA DUNST
Kirsten Dunst (que interpreta a Lee Smith) nos amarrota, nos atropela, nos deixa sem chão com suas expressões e atuação impecável. Em cada traço de seu rosto, de seu olhar, de seus suspiros e passos, você percebe a história daquela mulher e tudo que ela enfrentou para chegar até ali.
Alguns flashs de sonho que ela tem, é como a assinatura do atestado daquilo que a gente já prescrevera pela observação atenta e deleite com o filme. Entender o lugar de dor que muitos e muitas fotojornalistas que retratam a guerra já vivenciaram e ainda irão vivenciar, é especial e importante.
Por isso, ressalto que sinto como uma Ode a estes profissionais tão relevantes para a nossa História, registros são nossa memória enquanto humanidade.
Por fim, também percebo o quão a interação entre as personagens de Kirsten e Cailee Spaeny (que interpreta a Jesse) edificam ainda mais estas atuações memoráveis.
ALERTA SPOILER
Quando Lee se vê em um ataque de ansiedade e pânico, Jesse começa a nascer enquanto ato, saindo daquela potência que já existia dentro dela.
Ao entrar na Casa Branca, pela sacada profissional e de experiência de Lee, Jesse se entrega, Jesse ascende, é como o esvair de uma grande jornalista (Lee) no nascer de outra.
A cena da morte de Lee sendo fotografada freme-a-freme por Jesse nos paralisa. Porque a gente entende o peso que aquela imagem tem.
Wagner Moura (que interpreta o Joel) tem um papel importante, mas não de tanto destaque, poderia ser melhor explorado, compreendemos que ele é aquele cara que dá suporte e, principalmente, mantêm a Lee Smith viva, bem como leva sua cadernetinha para as anotações.
Afinal, não só os registros fotográficos são essenciais, mas também, os registros escritos.
Destaco, por fim que ele, Joel, é quem dá suporte, sabe os pontos fracos e fortes de Lee e percebe o quão ela fica abalada com a cena final da invasão à Casa Branca.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ao estilo um tanto “Twilight Zone” e, ressalto o quanto eu sou fã desta série (tanto da clássica que foi entre 1959 – 1964 quanto da contemporânea em 2019), Alex Garland explora o que poderia vir a acontecer com a America do Norte e, possivelmente com o mundo e outras tantas potências, caso viesse a estourar uma Guerra Civil.
Ele detalha em minúcias, deste a explosão local de pequenos grupos que se voltam uns contra os outros à pessoas malucas, extremistas que lançam perguntas como “Que tipo de americano é você?”, sim, porque a depender do “tipo de americano” que você for, não merece seguir com a vida.
Essas pequenas sacadas são dignas de uma mente brilhante mesmo, que busca desenvolver seu roteiro e direção para uma perspectiva mais sentimental e completamente dentro do que se espera de uma realidade distópica.
Possivelmente, esteja aí a pegada que me lembrou “Twilight Zone”.
Ademais, eu digo com muita propriedade que vale a pena a ida ao cinema para acompanhar esta obra de arte. Porque surpreende e é muito bem feita.
Endosso que não espere muito que tenha uma presença com mais falas e mais explorada do nosso querido Wagner Moura, porém, são pontuais e extremamente necessárias.
Espero que vocês gostem do filme e sejam levados a uma nova dimensão de uma realidade possível em um futuro distópico!
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