Mickey 17 é o sucessor de Parasita (2019), o aclamado longa vencedor do Oscar em 2020. A obra marcou uma conquista histórica para o diretor sul-coreano, que não apenas levou o prêmio de Melhor Filme Internacional, mas também o de Melhor Filme, a categoria mais prestigiosa da premiação, consolidando seu impacto no cinema mundial. Baseado no livro Mickey 7, cuja trama é similar, mas abordada de forma mais superficial, o filme surge como uma adaptação que busca preservar a essência da obra original, ao mesmo tempo em que amplia suas discussões e aprofunda os elementos de ficção científica.

A trama, embora simples, carrega o tom irônico e satírico característico do diretor, despertando a curiosidade do público. A escolha de Robert Pattinson como protagonista ainda é desafiadora, já que o ator segue no processo de se desvencilhar de sua imagem icônica como Edward na saga Crepúsculo. Para isso, tem apostado em projetos mais artísticos e alternativos, um movimento que se intensificou após seu destaque em O Farol (2019), o terror psicológico e conceitual de Robert Eggers.
A esse ponto de sua carreira, Pattinson se deleita em seu papel como Mickey Barnes, um esquisitão e trambiqueiro que vive tentando pagar suas dívidas com agiotas com planos mirabolantes ao lado de seu colega Timo, interpretado por Steve Yeun, que se destacou recentemente por seu papel em Não Olhe (2023). Em uma de suas tentativas desastradas de ganhar dinheiro, a dupla aceita, sem muito critério, participar de um experimento espacial comandado por Kenneth Marshall, um político interpretado pelo icônico Mark Ruffalo. O personagem é uma sátira que mescla traços de Donald Trump, do atual presidente dos Estados Unidos e de Elon Musk, um dos empresários mais influentes e investidores da tecnologia espacial.

Ao lado de Toni Collette, grande injustiçada pelo seu papel em Hereditário (2018), que interpreta com maestria a esposa do empresário, ambos assumem o papel de antagonistas excêntricos, quase caricatos, remetendo a clássicos vilões da Disney. Seus personagens funcionam como uma grande alegoria das figuras de poder norteamericanas contemporâneas, que se veem acima da ética e justificam suas ambições pessoais sob o pretexto de agir pelo bem da população.
Quanto ao enredo, se passa durante as primeiras missões no espaço, onde o protagonista serve de cobaia, um verdadeiro rato de laboratório (trocadilho com o nome do longa que se traduz a um rato). Sendo multiplicado, em corpos diferentes, mas com uma consciência única, a cada vez que sua missão falha, até conseguir, por exemplo, adquirir uma vacina para se adaptar aos germes e criaturas de outro planeta.
À primeira vista, o longa pode parecer apenas uma grande aventura, mas por trás da trama há reflexões sobre a ética na ciência e o poder político da elite mundial. Embora esses temas não sejam desenvolvidos com a mesma sofisticação de Parasita, o filme segue a linha de Okja (2017), outra obra do diretor que critica a exploração de animais e pessoas de maneira mais acessível ao público geral. Essa abordagem reforça a perspicácia e a versatilidade do cineasta em tratar questões relevantes, adaptando sua narrativa para diferentes públicos e explorando estilos distintos.

Além do humor ácido característico do diretor, o elenco principal consegue fugir da obviedade, entregando uma comédia exagerada que está à altura dos absurdos que acontecem dentro da espaçonave, criando um tom cômico que amplifica o impacto das situações surreais vividas pelos personagens. Quanto a sua fotografia, Mickey 17 equilibra efeitos práticos e CGI (efeitos de computação
gráfica), sendo uma experiência agradável pelo cuidado da produção na imersão neste universo criado para o filme, no cuidado desde os trajes dos tripulantes, até na ambientação de outros planetas.
No geral, Mickey 17 é uma experiência empolgante, com um elenco que brilha em cena e demonstra uma química envolvente. O universo criado é fascinante, e as marcas registradas do diretor estão fortemente presentes, equilibrando comédia e drama de forma cativante. No entanto, o desfecho, repleto de informações e conduzido de maneira confusa, pode frustrar parte do público que acompanhava o desenvolvimento gradual da trama.
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